Muito se tem debatido, principalmente por conta da pandemia, sobre o direito à desconexão que se constitui em uma prerrogativa dos empregados de se desligarem de qualquer contato físico ou telemático com os seus respectivos empregadores, fora da hora do expediente normal.
Do ângulo legal o tema foi regulado na França em 2017, na Itália no ano seguinte e em Portugal, mais recentemente em 2021, ainda que diferentemente em cada um dos países acima mencionados.
Os empregados, para os fins diversos de lazer, descanso e maior contato com a família tem o indiscutível direito de não serem obrigados ao atendimento de convocação ou de simples contato por meio dos sistemas modernos de comunicação (celulares, WhatsApp's, E-mail's, etc…) com os seus empregadores, fora da jornada de trabalho previamente estabelecida.
Com a pandemia decorrente da COVID-19, a questão ganhou um relevo derivado do enorme aumento do trabalho à distância, da grande quantidade de empregados que, pela natureza de suas funções, passaram para o regime do tele trabalho ou, pelo menos, para o regime híbrido, isto é parte do trabalho em casa e parte do trabalho nas instalações físicas dos empregadores.
Tirante aspectos diversos relativos à condição do trabalho “Home Office ", como, v.g. ergonomia, iluminação, ambiente, despesas, etc…, no presente artigo o foco diz respeito exclusivamente à fiscalização do trabalho a domicílio e o respeito ao cumprimento exato do labor dentro dos limites da jornada de trabalho e dos períodos de descanso, conquista dos empregados de que dá conta a evolução histórica do direito do trabalho e do pertinente sentido das suas normas protetivas. No particular, vale referência às regras do descanso das jornadas de 16 horas no século XIX, quando da Revolução Industrial, até hoje quando se inicia a discussão sobre a carga horária semanal de 4 dias como indicativo do aumento da produtividade, conforme a imprensa noticia.
No Brasil, o assunto foi provocado por ações trabalhistas nas quais se pleiteava, além de horas extras, uma indenização compensatória pelo excesso de jornada, com poucas decisões judiciais de procedência e com maioria sentenciada de modo negativo, a uma, pela inexistência de previsão legal e, a duas, pela dificuldade de prova robusta sobre a espécie. Tramita no Senado Federal o PL 4.044/2020 com o objetivo de regular o novel instituto.
É importante ressaltar que em face da ausência de preceito legal para a regulação da denominada desconexão, salvo a ordenação por meio de um instrumento coletivo acordado com o sindicato profissional que seria o ideal, no mínimo deve ser estabelecido um pacto formal entre empregado e empregador estabelecendo as condições necessárias aos períodos de desconexão.
Cabe ao empregador minimamente, como providência de cautela, desde que ausentes quaisquer tipos de ajuste, implementar de forma unilateral e, por escrito, a regulação do horário de trabalho do empregado inibindo o exercício de qualquer atividade do mesmo fora da sua jornada regular. Tal orientação mais ainda se impõe, por isso que, em um quadro de enorme desemprego, os próprios empregados, para demonstrarem submissão aos empregadores, são os primeiros a manterem vivos os canais de comunicação em qualquer dia e hora numa demonstração de interesse e fidelidade, tudo com o propósito da manutenção de seus lugares no quadro funcional. Para tanto conversam virtualmente além do tempo da jornada, nos dias de repouso e até nas férias, em ligação permanente, continuada e ininterrupta.
Não se deve olvidar que o lado negativo do tele trabalho está concorrendo, em percentual considerável, para o acometimento em proporção significativa para a Síndrome de Bornout (cansaço excessivo físico e mental) atingindo os empregados que laboram confinados nos seus lares, consoante registram as publicações médicas.
Em resumo: não cabe esperar. Faz-se necessário se antecipar e adotar medidas de prevenção. Qual? Quais? Não conseguindo acertar o relógio da jornada através acordo coletivo ou individual, o empregador deve fixar unilateralmente as regras da desconexão inserindo cláusulas próprias nos contratos de trabalho, com publicitação interna das regras. O objetivo é o de criar a cultura de que a conexão ininterrupta da relação empregado e empregador, ademais de ilegal, não é saudável. Muito pelo contrário, é causa continuada de risco financeiro para o empregador e risco para a saúde dos empregados, riscos estes que devem ser eliminados. A minimização dos riscos, em síntese, reduz eventuais prejuízos.
Agosto de 2022.
João Baptista Lousada Camara
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